Os
cadernos de cozinha de Leonardo da Vinci
Existem
dias na vida da gente que são tão tumultuados, tão estressantes que a impressão
que se tem é que tá na hora de dar um basta, brecar na descida, segurar o pé de
vento. E existem outros dias que nem com
varinha mágica ou com pó de pirlimpimpim seriam melhores.
Nestes
momentos você pode escolher entre o “sair gritando como doida pelo mundo à fora”,
o que acredito não ser a melhor solução,
pois sempre aparece um “parente dedicado”, um “amigo fiel” para perguntar se
você quer um calmante na veia ou uma estada no manicômio mais próximo e isso
pode deixá-lo, consequentemente, órfão do parente ou do amigo.
Existe
também a opção de você pode dar um basta, levantar a bunda da cadeira em que
está sentada e correr até o baú de
tesouros mais próximo ( no meu caso, minhas prateleiras de livros, filmes e
músicas) e dar aquela paradinha básica, saudável e imperativa para a manutenção
de todos os seus parafusos e miolos no lugar. Ler/reler algo muito gostoso, ver
aquele filme que já estava dando saudades, ou ainda, ouvir aquelas músicas
daquela banda que, mesmo que já tenha passado do balzaquiano há tempos, ainda
te emociona e te relaxa.
E
foi num desses momentos, numa aula ( das mais produtivas, mas também das mais
cansativas), que descobri, entre os materiais de aula da minha professora um
livro intitulado Os cadernos de cozinha de Leonardo Da Vinci.
Infelizmente,
embora uma admiradora entusiasmada do dono dos cadernos, nunca fui uma
pesquisadora nata de sua vida e de mínimos detalhes de sua existência, a não
ser poucas coisas que são comuns a muitos: sua homoafetividade, sua
genialidade, seu vegetarianismo, sua genialidade, sua capacidade criativa em
zilhares de campos e, por fim, sua genialidade.
Li
o livro todo em dois dias, desconsiderando as paradas para necessidades básicas
(bobagens diárias como comer, dormir, tomar banho, entre outras, que qualquer
ser humano, por mais atucanado e atrasado que possa estar, necessita), e achei
delicioso. Já na introdução há uma nota de esclarecimento informando que os
pesquisadores e historiadores da biografia da-vinciana discordam e alguns contestam
sua autenticidade, mas há possibilidade de serem verdadeiros por terem sido
encontrados junto a outros que seriam verídicos.
Isso
tudo não faz muita diferença no processo de leitura, pois o texto é uma aula de
que a melhor arma contra o tempo e o esquecimento ainda é a escrita. No livro
há muitas e muitas dicas de alimentação, sim, mas também há informações
preciosas sobre os usos e costumes de uma época por si só perturbada e
perturbadora. Da Vinci, e assim quero crer
que tenha sido, registrava informações que podem até soar engraçadas nos dias
de hoje, mas que na época eram de uso comum. Vale a leitura, nem que seja para
respirar novos ares, dar uma pausa na tumultuada vida diária.
Tentei
encontrar o livro para comprar, mas não consegui. Apenas duas cópias na Estante
Virtual, porém com preços tão abusivos que quase movo um processo por tentativa
de extorsão contra os anunciantes.
Em
contrapartida, reuni alguns trechos para compartilhar, pois só pelas risadas,
pelas arrepiadas e pelos sustos que me proporcionaram, já estão valendo como
calmante no cérebro.
Enjoy!
Da
série [...] “pratos simples:
“O
que o Meu Senhor Ludovico tem em sua mesa fere a minha vista. Todos os pratos
são monstruosos... é tudo abundância. Assim
comiam os bárbaros. Como poderei convencê-lo disso, cada vez que
despreza meu prato de couves e não encontra para minhas ameixas com cenoura
lugar sobre sua toalha de mesa? Porque há em uma couve simples mais beleza, e
em uma cenoura pequena mais dignidade que em seus doze recipientes cheio de
carne e ossos. Em uma velha ameixa há
mais delicadeza e em duas favas verdes mais alimento. O que devo fazer para que
Meu Senhor Ludovico veja isso? Meu Senhor Ludovico tem de redescobrir a
qualidade da simplicidade. E não apenas ele, mas todos os povoadores da terra.[...]- Para cortar um porco em cubos;
- Para depenar patos;
- Para prensar uma ovelha;
- Para fazer purê
- Para moer um porco
Entretanto,
como vou acioná-las? Por vento? Por água? Através de manivelas ou rodas
dentadas? Por bois ou tração humana? [...]
[...]
Tampas para panelas: Cada vez que se
leva uma panela ao fogo deve-se cobri-la com um pano molhado, que precisa ser
trocado frequentemente para evitar que a fumaça se misture com o conteúdo da
panela e altere o sabor. Há centenas de anos que isso é assim. Bem, agora eu me
pergunto: Não poderia ser inventada para as panelas uma cobertura permanente
que fosse tão indestrutível quanto a panela, estivesse sempre ao alcance da mão
e não precisasse ser trocada a cada momento? Farei um projeto...[...]
Parece-me
indigno de tempos presentes o costume de Meu Senhor Ludovico de amarrar coelhos
à cadeira de seus convidados para que estes possam limpar a gordura das mãos
nas costas dos animais. Além disso, quando, depois da refeição, as animais são
recolhidos e levados ao lavadouro, contaminam a outra roupa que é lavada ao seu
redor. Tampouco posso compreender o costume que tem Meu Senhor Ludovico de
limpar sua faca na roupa de seus companheiros de mesa. Por que não o faz, como
o resto dos membros da Corte, na toalha de mesa? [...]
[...]
sobre os procedimentos indecorosos à
mesa do Meu Senhor Ludovico.
Há
certos procedimentos indecorosos que todo convidado à mesa de Meu Senhor
Ludovico deve evitar (este catálogo está baseado em observações que realizei ao
longo do último ano entre os que sentaram a esta mesa):
- Nenhum convidado deverá sentar em cima da mesa,
nem de costas nem sobre a roupa de outro convidado;
- Nem deverá botar sua perna em cima da mesa;
- Não porá sua cabeça no prato para comer;
- Não pegará a comida de seu vizinho sem antes
pedir licença;
- Não porá pedaços mastigados de sua própria comida
no prato de seu vizinho sem primeiro perguntar a ele;
- Não limpará sua faca na roupa do vizinho. [...]”


Nenhum comentário:
Postar um comentário