terça-feira, 26 de novembro de 2013

Os cadernos de cozinha de Leonardo da Vinci

Existem dias na vida da gente que são tão tumultuados, tão estressantes que a impressão que se tem é que tá na hora de dar um basta, brecar na descida, segurar o pé de vento.  E existem outros dias que nem com varinha mágica ou com pó de pirlimpimpim seriam melhores.
Nestes momentos você pode escolher entre o “sair gritando como doida pelo mundo à fora”, o que  acredito não ser a melhor solução, pois sempre aparece um “parente dedicado”, um “amigo fiel” para perguntar se você quer um calmante na veia ou uma estada no manicômio mais próximo e isso pode deixá-lo, consequentemente, órfão do parente ou do amigo.
Existe também a opção de você pode dar um basta, levantar a bunda da cadeira em que está sentada e correr até o  baú de tesouros mais próximo ( no meu caso, minhas prateleiras de livros, filmes e músicas) e dar aquela paradinha básica, saudável e imperativa para a manutenção de todos os seus parafusos e miolos no lugar. Ler/reler algo muito gostoso, ver aquele filme que já estava dando saudades, ou ainda, ouvir aquelas músicas daquela banda que, mesmo que já tenha passado do balzaquiano há tempos, ainda te emociona e te relaxa.
E foi num desses momentos, numa aula ( das mais produtivas, mas também das mais cansativas), que descobri, entre os materiais de aula da minha professora um livro intitulado Os cadernos de cozinha de Leonardo Da Vinci.
Infelizmente, embora uma admiradora entusiasmada do dono dos cadernos, nunca fui uma pesquisadora nata de sua vida e de mínimos detalhes de sua existência, a não ser poucas coisas que são comuns a muitos: sua homoafetividade, sua genialidade, seu vegetarianismo, sua genialidade, sua capacidade criativa em zilhares de campos e, por fim, sua genialidade.
Li o livro todo em dois dias, desconsiderando as paradas para necessidades básicas (bobagens diárias como comer, dormir, tomar banho, entre outras, que qualquer ser humano, por mais atucanado e atrasado que possa estar, necessita), e achei delicioso. Já na introdução há uma nota de esclarecimento informando que os pesquisadores e historiadores da biografia da-vinciana discordam e alguns contestam sua autenticidade, mas há possibilidade de serem verdadeiros por terem sido encontrados junto a outros que seriam verídicos.
Isso tudo não faz muita diferença no processo de leitura, pois o texto é uma aula de que a melhor arma contra o tempo e o esquecimento ainda é a escrita. No livro há muitas e muitas dicas de alimentação, sim, mas também há informações preciosas sobre os usos e costumes de uma época por si só perturbada e perturbadora.  Da Vinci, e assim quero crer que tenha sido, registrava informações que podem até soar engraçadas nos dias de hoje, mas que na época eram de uso comum. Vale a leitura, nem que seja para respirar novos ares, dar uma pausa na tumultuada vida diária.
Tentei encontrar o livro para comprar, mas não consegui. Apenas duas cópias na Estante Virtual, porém com preços tão abusivos que quase movo um processo por tentativa de extorsão contra os anunciantes.
Em contrapartida, reuni alguns trechos para compartilhar, pois só pelas risadas, pelas arrepiadas e pelos sustos que me proporcionaram, já estão valendo como calmante no cérebro.

Enjoy!
Da série [...] “pratos simples:
“O que o Meu Senhor Ludovico tem em sua mesa fere a minha vista. Todos os pratos são monstruosos... é tudo abundância. Assim  comiam os bárbaros. Como poderei convencê-lo disso, cada vez que despreza meu prato de couves e não encontra para minhas ameixas com cenoura lugar sobre sua toalha de mesa? Porque há em uma couve simples mais beleza, e em uma cenoura pequena mais dignidade que em seus doze recipientes cheio de carne e ossos.  Em uma velha ameixa há mais delicadeza e em duas favas verdes mais alimento. O que devo fazer para que Meu Senhor Ludovico veja isso? Meu Senhor Ludovico tem de redescobrir a qualidade da simplicidade. E não apenas ele, mas todos os povoadores da terra.[...]


[...] “máquinas que ainda devo construir para acrescentar à minha cozinha
  • Para cortar um porco em cubos;
  • Para depenar patos;
  • Para prensar uma ovelha;
  • Para fazer purê
  • Para moer um porco
Entretanto, como vou acioná-las? Por vento? Por água? Através de manivelas ou rodas dentadas? Por bois ou tração humana? [...]
[...] Tampas para panelas: Cada vez que se leva uma panela ao fogo deve-se cobri-la com um pano molhado, que precisa ser trocado frequentemente para evitar que a fumaça se misture com o conteúdo da panela e altere o sabor. Há centenas de anos que isso é assim. Bem, agora eu me pergunto: Não poderia ser inventada para as panelas uma cobertura permanente que fosse tão indestrutível quanto a panela, estivesse sempre ao alcance da mão e não precisasse ser trocada a cada momento? Farei um projeto...[...]

[...] Sobre os modos a mesa do Meu Senhor Ludovico e seus convidados.
Parece-me indigno de tempos presentes o costume de Meu Senhor Ludovico de amarrar coelhos à cadeira de seus convidados para que estes possam limpar a gordura das mãos nas costas dos animais. Além disso, quando, depois da refeição, as animais são recolhidos e levados ao lavadouro, contaminam a outra roupa que é lavada ao seu redor. Tampouco posso compreender o costume que tem Meu Senhor Ludovico de limpar sua faca na roupa de seus companheiros de mesa. Por que não o faz, como o resto dos membros da Corte, na toalha de mesa? [...]

[...] sobre os procedimentos indecorosos à mesa do Meu Senhor Ludovico.
Há certos procedimentos indecorosos que todo convidado à mesa de Meu Senhor Ludovico deve evitar (este catálogo está baseado em observações que realizei ao longo do último ano entre os que sentaram a esta mesa):

  • Nenhum convidado deverá sentar em cima da mesa, nem de costas nem sobre a roupa de outro convidado;
  • Nem deverá botar sua perna em cima da mesa;
  • Não porá sua cabeça no prato para comer;
  • Não pegará a comida de seu vizinho sem antes pedir licença;
  • Não porá pedaços mastigados de sua própria comida no prato de seu vizinho sem primeiro perguntar a ele;
  • Não limpará sua faca na roupa do vizinho. [...]”

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