domingo, 24 de março de 2013

Invisível e doloroso mundo cão

Terminei de ler na semana que passou o livro As vantagens de ser invisível, de Stephen Chbosky. Confesso, com um certo constrangimento, que só peguei o livro para ler depois de minha filha ter falado  muito nele, e um amigo ter feito um post no facebook, perguntando sobre opiniões pós leitura.
Digo constrangimento por que a primeira coisa que pensei foi: ah, o que poderá vir de um livro que fala de mais uma turma de high school americana?
É. Pois é. Eu fiz isso.. Shame on me!
Comecei a ler o livro, que é pequeno (tem 223 páginas) e fui jogada para dentro da intimidade de Charlie, um garoto de 15 anos, que é muito peculiar já nas primeiras frases. Para começar, toda a narrativa é feita através de cartas que Charlie escreve a um amigo invisível, mas que até o final do livro dá para se ter uma ideia de quem possa ser esse amigo, embora tudo fique somente na especulação, pois nada é revelado de concreto. Tudo isso é feito através de cartas datadas, inicialmente a partir de 25 de agosto de 1991, onde o mais importante é o que ele escreve e como ele escreve a esse amigo.

E aí está o principal trunfo do livro: ele revela toda a intimidade desse garoto de 15 anos, sua família, seus amigos, sua escola, enquanto que, ao mesmo tempo, não deixa nada explícito, fazendo com que o leitor se posicione na história e vá descobrindo os acontecimentos presentes, passados e prevendo futuros, sem saber como é levado a isso.
A linguagem é doce e crua ao mesmo tempo e vemos tudo pelos olhos de Charlie, sem sermos privados de entender nas entrelinhas, o que nem sempre é agradável.
Terminei de lê-lo de um fôlego só e não parei de pensar no assunto durante uns dois dias.
O livro é chocante, doloroso e cruel. Ele fala sem meias palavras (mesmo quando Charlie pede desculpas por se sentir obrigado a usar palavrões para descrever o que precisa no momento), sobre o adolescer de  um garoto muito especial e de quem quase todos esperam alguma coisa, o tempo todo. E é nesse ponto que se percebe que Charlie não é um garoto comum. Charlie é especial. Muito mais especial do que se deduz no início.
Além das referências bibliográficas durante a narrativa, o autor ainda faz uso da música para emprestar elementos e contar tudo sem explicitar nada, ou seja, todas as referências musicais são perfeitamente encaixadas no momento em que surgem, com os acontecimentos em curso.
Isso também acontece com algumas obras literárias que o professor de inglês dá a Charlie, pedindo que ele force a análise e promova resenhas críticas, permitindo assim que o autor continue contando sem contar tudo que está inserido, disfarçadamente, nas literaturas de Charlie.
Se falar mais sobre o assunto, acabo entregando a história toda e não é essa a intenção da postagem.
O que quero dizer é que o livro é cheio de linhas e entrelinhas. É cheio de esquinas e dores espalhadas explícitas e escondidas. E cheio de momentos bomba-tapa-na-cara como quando Bill, o professor diz:
-Charlie, a gente aceita o amor que acha que merece!
Depois dessa ruminação de ideias, vi o filme com aquela gracinha de ator chamado Logan Lerman, a linda e deliciosamente plena Sam, da Emma Watson, que em alguns momentos força o sotaque americano, mas que não faria falta alguma se ela falasse no seu bom e delicioso inglês britâncio. E há também  o meu personagem favorito da turma toda: Patrick, representado fantasticamente pelo ator Ezra Miller. O garoto é brilhante em construir um Patrick irônico e debochado com a maioria das travadas e pancadas da vida.
O filme é quase literal, porém peca em deixar de fora alguns elementos que dariam mais sustentabilidade ao enredo, pois terminei o filme com a certeza de que não teria entendido toda sua essência se não tivesse lido o livro. Mas o que o filme tem de melhor, fora Ezra é, sem dúvida alguma, a trilha sonora. E além do Patrick do Ezra, aplausos para o final do filme. Um fechamento alternativo e sensível, que permitiu serenar o coração, depois de tantas pancadas e dores engolidas durante a película toda.
Na página 5 há um pequeno flash da narração em que os amigos Charlie, Sam e Patrick estão rodando de carro, numa das mais belas cenas do livro, e Patrick encontra no rádio uma canção que é "explicada" mas não citada. Essa canção, quando fiz a leitura da cena tive certeza de que era Heroes, do Bowie, pois nenhuma outra se encaixaria ali, naquele momento, naquela parte da história, com tanta perfeição, com tantos motivos para estar ali. Por que só ela poderia ser "infinita" para combinar com tudo aquilo narrado. E, ao assistir o filme, qual não foi minha surpresa ao ouvir a música que eu imaginei que seria e na voz do "cara". Só isso já valeria o filme todo, mas o todo ficou muito melhor do que o meu pré-conceito poderia esperar.
Então, aqui fica uma dica de livro e filme que valem a pena compartilhar. Algo que me assegurou que nem tudo que reluz é ouro e nem tudo que não aparece é, de fato, invisível.
E se você chegar ao final do livro com a certeza de que David Bowie, New Order, The Smiths, entre outros te fizeram companhia ate ali, você entendeu tudo que leu com a mesma intensidade que eu. E isso faz de nós ou Heroes ou Asleep..ers !


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